Nunca fui um aficionado por Porsche, ou por historias envolvendo os mesmos, como o acidente de James Dean em setembro de 1955, a bordo de um emblemático 550 Spyder, até acontecer o meu emprego atual, ai, cercado de Porsche por todos os lados, desmonta um , monta outro, conserta outro, o interesse foi inevitável .
E conversa vai, conversa vem, surgiram historias sobre um motor denominado Fuhrmann ou Projeto 547, sem duvida,um louco, raro e caro motor a combustão. O Projeto 547 foi o motor que de certa forma transformou os 356 de então, nos badalados Porsche Carrera de hoje.Até então, ao meu ver , Ferdinand Porsche não via sua empresa como uma fabricante de esportivos de alta performance.
Já em 1951, os pequenos motores Porsche e Volkswagen mantinham as mesmas características básicas e eram visualmente muito parecidos, mas não tinham mais peças em comum. Até que os engenheiros da Porsche se voltaram para as competições. O valente motor teve sua cilindrada aumentada para 1.500 cm³ e recebeu uma série de desenvolvimentos que lhe trouxeram mais potência e confiabilidade. Mas mesmo com 1.500 cm³, não era páreo para os motores da época. Era necessário um motor completamente novo e extremamente competitivo.
Ernst Fuhrmann e o 547 |
O obejetivo maior do projeto era ser vencedor. Fuhrmann não hesitou em prover o 547 com a melhor e mais sofisticada tecnologia da época, prática, por sinal, adotada até hoje pela Porsche. O novo motor traria câmaras de combustão hemisféricas e alumagem dupla e carburadores Solex 40. Para uma refrigeração mais eficiente, uma nova ventoinha que sugava ar pelos dois lados, desenvolvida pelo engenheiro aerodinâmico Franz Reimspiess. . Isso consumia 5% a mais da potência, mas fornecia quase 60% a mais de ar fresco às camisas. Para superar as limitações do antigo motor , Decidiu-se então por usar não somente um virabrequim de cinco mancais, mas empregar o complicado sistema Hirth, que utiliza rolamentos ao invés de mancais e bielas construídas em uma só peça. Nesse sistema o virabrequim éinteiramente desmontável. Nos cabeçotes, duas grandes válvulas por cilindro, com comando duplo sobre cada cabeçote (como são dois cabeçotes, temos quatro comandos de válvula). Neste ponto, o que já era sofisticado começa a ficar complicado. Reza a lenda que o objetivo de Fuhrmann era colocar o motor no seu 356. Para movimentar quatro comandos de válvula, engenheiros de outras fábricas não hesitariam em usar correntes metálicas,isso alongaria o motor,um motor mais longo serviria ao futuro Porsche 550 e aos RS60, mas não caberia no 356 de Fuhrmann. Ele decidiu então acionar os comandos por eixos e engrenagens a partir do centro do motor, sem alongá-lo. E o que era complicado ficou complicadíssimo. O sistema contava com quatro comandos de válvula, quatro eixos motrizes (por sua vez ocos, levando óleo aos cabeçotes) e nada menos que 15 engrenagens. Parece simples no papel, mas para montar este quebra-cabeças e afinar toda esta orquestra eram necessárias 120 horas de trabalho de técnicos bem treinados, levavam cerca de oito horas somente para sincronizar os comandos.O resultado foi uma barulhenta peça de relojoaria, que pe-sava somente 140 kg e rendia 150 cv a 8.000 rpm. Com alguns acertos renderia 180 cv, e em sua versão final, 200 cv.
Ficou então decidido que para o ano de 1955 o motor 547 seria disponibilizado ao público, instalado no 356 A. O casamento entre o motor de competição 547 e o sexy 356 gerou um automóvel com caráter próprio. A ele, foi dado um nome que homenageava a mais importante conquista esportiva da Porsche em 1953: Carrera, alusivo à Carrera Panamericana.
O nome Carrera acabou sendo confundido com o motor de quatro comandos. Este motor sofreu, ao longo dos dez anos em que foi produzido, várias modificações e aperfeiçoamentos. O complicado e caro virabrequim Hirth foi substituído por um sistema mais simples e leve, usando mancais planos Sua cilindrada subiu para 1.600 cm³ em 1958, e finalmente 2.000 cm³ (denominado tipo 587) em 1962.
Foram produzidos em pequena quantidade por serem caros e de uso muito específico até o encerramento de sua produção, em 1964. O quatro comandos,ou motor Carrera, foi empregado com sucesso nos Porsche 550, Speedster, RS60, RSK e 904, e também impulsionou carros de Fórmula 3, Fórmula 2 e Fórmula 1.
Devido à complexidade de sua construção, os motores demandavam uma operação criteriosa por parte do proprietário ou piloto, e muita mão-de-obra especializada. O uso contínuo em baixas rotações causava problemas nos rolamentos do virabrequim e o sistema de comandos de válvula era indecifrável aos não-iniciados. Talvez por conta disso não tenham sobrado muitas destas maravilhas... As que ainda funcionam são tratadas como verdadeiros tesou-
ros. Tesouros que ainda viram a 8.000 rpm nas provas de carros clássicos. Ainda hoje se diz que 4.000 rpm são marcha lenta para estes motores.
A engenhoca de Fuhrmann foi fundamental para a imagem da Porsche como fabricantes de carros esporte. Sem ela, os pequenos Porsche não teriam derrotado máquinas de outras marcas (equipadas com motores de maior cilindrada e com maior número de cilindros) e não teriam estabelecido um lugar de respeito no cenário mundial nas décadas de 1950 e 1960. Os Porsche 356 Carrera eram carros caros, exclusivos e muito velozes. Comparáveis aos GT3 e GT2 de hoje, são o auge do desenvolvimento do modelo 356, que deu inicio à linha Porsche em 1948.Este sucesso trouxe o nome Carrera aos produtos Porsche.